terça-feira, 12 de outubro de 2010

Artigo publicado no DP, dom, 10.10.2010

VITÓRIA DE MARINA
Clóvis Cavalcanti
Economista ecológico e pesquisador social

Se houve um vencedor verdadeiro nas eleições de 3 de outubro, seu nome é Marina Silva, e a bandeira que empunhou. Contra todas as expectativas (seus seguidores achavam que, se ela tivesse 15% dos votos, seria uma conquista) Marina atingiu 20% dos votos válidos no país. Para isso, dispôs de tempo mínimo no programa eleitoral gratuito, enquanto Dilma Rousseff aparecia demoradamente, além de contar com todo aparato do governo que representava na disputa para fazer promoção de sua candidatura. Afora isso, as “pesquisas” sempre apontavam Marina com um porcentual de votos que não coincidia com o sentimento das ruas. Aliás, está na hora, mais uma vez, de pôr em dúvida a seriedade desses levantamentos. Primeiro que tudo, não deveriam se chamar de “pesquisas”. Pesquisa é o trabalho científico rigoroso que se faz nos laboratórios, nos departamentos universitários e nos institutos independentes (como o de Matemática Pura e Aplicada, Impa, o Nacional de Pesquisas da Amazônia, Inpa, o Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas, CBPF, a Fiocruz). Em inglês, pesquisa é research. Levantamentos eleitorais e de opinião se chamam de poll. A instituição que os executa recebe o nome de pollster. Em espanhol faz-se idêntica distinção: investigación (pesquisa) e encuesta. Mesma coisa no francês: recherche e enquête. Por outro lado, as tais margens de erro – tipo 2% para mais e 2% para menos – precisam ser explicadas. O que isso quer dizer? Na pesquisa científica, estudos por amostragem indicam margens que dependem do desvio padrão. Não é o caso das polls. Elas informam o mesmo intervalo de confiança, quer a medida seja de 51% (resultado da votação de Dilma na “pesquisa” de boca de urna usada pela TV Globo, um fiasco completo), quer seja de 1%. Neste último caso, a votação poderia atingir então -1%! Uma tolice. A propósito, a Rede Globo insistia em mostrar resultados de “pesquisas” de boca de urna quando as apurações estavam avançadas, como se isso significasse alguma coisa. É fazer de bobo o telespectador. Àquela altura, os resultados já mostravam com clareza a besteira das consultas prévias à votação. Nesse ponto, a Band seguia um caminho de melhor senso. Trouxe pessoas competentes para falar, como o senador Álvaro Dias e o marqueteiro José Lavareda. O primeiro chamou atenção para o nó que estava sendo dado nas “pesquisas” pela apuração dos votos, coisa que, em nenhum momento, apareceu no universo pasteurizado de informação da Globo.
Pois bem, o Brasil deu sinal de vida. Não acreditou na edulcorada propaganda da candidata Dilma Rousseff, amparada nas margens extraordinárias de aprovação do governo Lula. E tinha razões para desconfiar, inclusive pela triste história dos escândalos inadmissíveis dos últimos oito anos. Francamente, eu esperava tudo de um governo do PT, menos a reprodução de práticas de mau uso de recursos públicos na escala verificada. Nesse particular, se uma candidatura a presidente da República merece a qualificação de “ficha limpa”, é o caso da de Marina. O Brasil viu isso e apoiou a novidade humilde e verdadeira da candidata do Partido Verde. Vale lembrar que foi Sérgio Xavier, presidente do PV em Pernambuco e candidato a governador do Estado (com 2% dos votos, uma vitória), quem convenceu Marina a aceitar ser candidata. Ele a trouxe para o partido também. Foi auxiliado, claro, por muita gente; porém, a iniciativa partiu dele. Pessoalmente, fiquei muito feliz com o resultado da eleição. Queria, obviamente, que o PV tivesse a oportunidade de poder dispor de tempo para, com Marina, passar uma mensagem nova aos eleitores do país. Aí, sim, se poderia ver a diferença entre o discurso sustentabilista sério do movimento ambiental e a retórica crescimentista oca dos adoradores do deus crescimento. De qualquer forma, nas urnas do Colégio de São Bento, em Olinda, meu domicílio eleitoral, Marina teve 832 votos (36%), contra 1.045 de Dilma (45%) e 445 de Serra. Uma vitória para minha candidata – que era só felicidade no discurso da noite do dia 3.

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